segunda-feira, 13 de junho de 2011

Não deve ser nada. Não sei bem o que é e por isso mesmo não deve ser nada. Porque às vezes quando acordo. Quando acordo não, quando tento dormir. Realmente não deve ser nada, só um desconforto. Quem não sente um desconforto de vez em quando? Porque parando pra pensar não tem motivo pra ser nada e não consigo explicar o que é além de dizer que às vezes quando tento dormir e minhas pernas tremem, que às vezes já é hora de acordar e minhas pernas não se movem, e eu tento ainda me esconder onde não está mais lá e já não estava lá quando eu. Mas certamente não é nada além de um desconforto, quanto a isso pode confiar em mim. Um vazio desses que não pode se explicar por vazio porque às vezes aperta e alarga e sufoca em excesso, e vazio não pode ser excesso e excesso não pode ser vazio, e por isso, por não saber o que é além de um desconforto que se disfarça em opostos e que precisaria de uma palavra outra que não desconforto pra explicar, não deve ser nada. Ou pelo menos não deve ser nada que se possa dar nome porque já tentei dizer que é angústia, ansiedade, insônia, agonia, aflição e já tentei diluir em água, álcool, solvente, corridas de carro, acordes de violão e sinceramente não deve ser nada além de uma vontade louca de ter vontade de alguma coisa que não seja parar um pouco. Parar não sei bem com o que, mas definitivamente parar, porque deve ser algumas coisa que me faz sentir assim desse jeito nuvem que eu não sei explicar e me pergunto sempre se realmente é alguma coisa logo antes de dizer que não deve ser nada além de um desânimo passageiro desses que todo mundo sente de vez em quando. Desses que deveria passar logo, que vai passar logo, que não deve ser nada além de uma dificuldade passageira de entender sentidos, de dar significados. Não sei se todo mundo tem essa vontade, digo, a vontade de entender significados. Sem perguntas fáceis que façam a pessoa parecer inteligente. Uma vontade dessas de perceber sem ilusões porque eu entendo que as ilusões são necessárias pra quem as tem, mas as minhas já estão tão gastas de poemas e fotografias e telefonemas e telenovelas e explicações e ausências que certamente não me servem pra outro motivo que não evitar as rimas. Evitar que as palavras que eu alugo pra falar de mim se abracem com outras palavras porque acho que falam melhor sozinhas. Porque acho que nesse momento falam melhor sozinhas. Mesmo sem saber dizer o que é essa coisa que na verdade é só muito nada apertado e comprimido dentro de mim e em volta de tudo enquanto todo mundo se esbarra ou se agride ou se ama ou medita ou faz qualquer outra merda sem sentido pra dar sentido ou simplesmente pra alienar qualquer capacidade de qualquer coisa dizendo que não deve ser nada, só um desconforto antes de dormir que todo mundo sente em algum momento. Só um desconforto ao acordar que eu pergunto se as outras pessoas sentem sem realmente estar interessado em saber se as outras pessoas sentem, porque não acho que seja uma questão de identificação com um padrão de normalidade que me faz sentir assim. Às vezes não é nada mais do que não saber o que dizer. Nada mais do que ter vontade de não ser mais nuvem estilhaçada de palavras alugadas sem rimas porque falam melhor sozinhas, porque falam melhor em ausência de alguma coisa que não deve ser nada, que não sei bem o que é e por isso mesmo não há de ser nada.

Daniel M. Laks
13/06/2011

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Se naquele momento eu tivesse cortado um pedaço da língua com dentes de guilhotina será que a gente se comunicava melhor? Porque com qualquer verdade dentro de mim agora te negaria um poema a canhões de confetes e fogos de artifício: desses de balões de éter com estrelas desgovernadas e naipes de saxofone em colisão com todo o silêncio que esfumaça dentro de mim máquina de costura em nuvens que desventam amanhã com a obra na casa do vizinho povoando os sonhos de marretas e britadeiras em atrito com os copos vazios ao lado da poltrona ou o torcer dos lábios perdidos que escorreram já a algumas ruínas de areia e se agora eu sangrasse toda a apatia vendaval amortecido dos seus olhos e te pedisse uma gota de mar você sereia a se afogar nas flores de olhos fechados das bocas dos mares profundos enquanto durar essa dança enquanto durar essa volta toda a indiferença do meu caleidoscópio de palavras pontiagudas esquecidas em cima do sofá.

Daniel M. Laks
03/06/2011