domingo, 30 de janeiro de 2011

Provavelmente começaria de outro jeito, se esta carta estivesse sendo escrita para ser enviada para você. Passaria um bom tempo pensando qual seria o melhor tom pra não te dizer nada realmente sincero, não sei se você entende, mas é que eu tenho uma dificuldade muito grande de aceitar os ventos que eu não sopro. Por ser assim tão areia, e não deixar seguir com o movimento das marés, passei um tanto de horas prestando atenção nos começos e perdi o tempo das nossas histórias, tão sempre sem início. Não discuto que tudo o que rabisco em pedaços de madeira é para ser lido, o que pra mim é comum a tudo o que se escreve. Mas se eu fosse enviar essa carta para você, provavelmente começaria dizendo como está o Rio de Janeiro e te descreveria uma rotina que não é a sua e nem é assim tanto a minha, entende? Contaria meus projetos e planos, ou inventaria alguma coisa interessante para contar, porque eu tenho feito e inventado um bando de atividades para me manter ocupado. E logo começaria a te perguntar todas aquelas perguntas curtas que abrangem um mundo muito maior do que as páginas que você poderia me escrever, se eu fosse te enviar essa carta, e se, por acaso, você fosse dessas pessoas que responde cartas. Entende?

Mas a verdade é que hoje eu estava escutando o barulho do vento nos pinheiros e me deu uma vontade tremenda de dizer que adorei te encontrar e gostaria muito de te conhecer. Enfim, dizer que algo é “a verdade”, olhando agora, me parece um pouco forte demais e não sei se essa é “a verdade”. Pensando bem, a vontade de dizer já vinha de antes de escutar os pinheiros sussurrando as minhas sílabas que ainda estavam verdes. Você já sentiu que algumas frases fazem mais sentido depois do pôr do sol, ou que você, algum dia, leu alguma coisa pra que ela fosse indissociavelmente sua? Eu hoje pensei em te convidar para um desses lugares onde a areia relampeja os reflexos dourados das estrelas e o mar alcança mais longe que o castanho dos seus olhos. Um desses lugares que as flores têm o perfume de uma noite apenas, e que sempre existem nas possibilidades das folhas de papel lambuzadas com excessos de tinta: igualzinho a nós dois, ou àquelas lembranças metálicas do que chamamos sonhos.

Porque dentro de todo esse lirismo que eu recorro, pra fugir de te falar qualquer coisa que não se disperse no ar, eu sei que nós já tivemos nossos nós, já tivemos nossas noites e é por isso que você que agora é você já foi tantas antes de ser você. Eu me vejo escrevendo os mesmos turbilhões repetidamente e você sendo sempre você, mas em tantas formas, nomes e trejeitos, e sempre sem querer saber que algumas vezes eu sou nuvem, muro ou musgo, que acho melhor não te enviar essa carta, de escrita afiada em fruto tão verde. E eu espero que você entenda, mesmo sem nunca vir a saber, entende?

De qualquer forma, e apenas pelo abuso do sarcasmo que mimetize os dentes à mostra entre os lábios vermelhos, te agradeço pelos meus próprios versos e me comprometo a não aguar nenhum sorriso compartilhável.

Um beijo carinhoso algum dia,

E todas as coisas que eu sempre te repeti, mas nunca te disse.


Daniel M. Laks

29/01/2011

Um comentário:

Gaby Morenah disse...

que bonito dani, parabéns pelos textos, adorei o blog, bjs gaby